Decisões erradas de cima, do banco e no campo marcam vexame do Flamengo no Mundial
Aposta arriscada de mudança do comando técnico custa caro, e partes verbalizam necessidade de adaptação; contra árabes, time vacila muito
Se tem uma coisa que o torcedor do Flamengo não quer hoje é discutir tática. A eliminação para o Al Hilal na semifinal do Mundial, um dos maiores vexames da história rubro-negra, seria simples de se explicar se nos apegássemos aos 90 minutos: erros individuais em campo e substituições a explicariam. Mas, se fizermos uma panorama geral, a conta do revés tem de ser dividida em três partes: diretoria, jogadores e treinador.
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Diretoria: mudança abrupta custa caro
O discurso de "falta de tempo" utilizado em comum por Vítor Pereira e atletas para justificar tropeços mostra que a direção fez aposta arriscada ao mudar o comando técnico na virada do ano. Independentemente se VP terminará o ano com títulos de peso e o Flamengo jogando futebol insinuante ou não, a ousadia custou caro. O comando do clube errou.
Uma das principais lideranças do grupo, Gabigol, mesmo apoiando Vítor Pereira após a eliminação, foi enfático ao dizer que um início de trabalho obviamente necessita de adaptação.
- A responsabilidade é dividida, não é só dele. Tem todos os jogadores, a diretoria e o staff. Claro, como já falei milhares de vezes, que tem influência. É um trabalho novo, com pouco tempo, e é claro que tem influência. Não podemos usar isso como muleta, mas temos que melhorar - afirmou Gabigol após a derrota.
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É verdade que o time caiu no fim da última temporada, teve atuações abaixo da média nas decisões da Copa do Brasil e da Libertadores, mas apresentou queda física também.
O Flamengo alega que Dorival Júnior pediu alto e viu em Vítor uma oportunidade de mercado interessante. A questão não é a escolha por VP, mas a mudança abrupta de filosofia que cobrava rápida adaptação de todos, como Gabigol, Filipe Luís e outros atletas já falaram.
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Jogadores
Ainda sem química em campo com pouco mais de um mês sob orientação de VP, os jogadores pouco criaram enquanto o jogo estava em 11 contra 11. A verdade é que no primeiro tempo o Flamengo só levou perigo duas vezes, ambas com Pedro. Numa cabeçada e no gol. Insuficiente para um elenco poderoso.
Mais graves do que a falta de repertório, porém, foram os erros individuais. O Hilal tem méritos. Cuéllar, Marega, Al-Dawsari e Vietto, por exemplo, são bons exemplos de atletas que jogaram em alto nível. Todos os gols dos árabes, porém, nasceram de graves erros individuais.
O primeiro fica na conta de Matheuzinho. É verdade que Ayrton poderia ter espanado a bola antes, e Santos ter abafado a bola, mas o pênalti cometido pelo lateral foi muito infantil.
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O segundo - e golpe mais grave - é de autoria de Gerson, que até agora não entregou no retorno ao Flamengo.
Já estava pendurado na partida ao simular um pênalti na área adversária que lhe custou um exagerado cartão amarelo. Mas, mesmo com o excesso de rigor do árbitro romeno, o agora experiente meio-campista sabe que não poderia chegar por trás em Vietto. Acabou expulso no fim do primeiro tempo e prejudicou o time.
Embora pouco agredisse, o Flamengo controlava o jogo no 11 contra 11 e, ainda que faltassem combinações, a virada parecia factível às vésperas do intervalo. Não aconteceu.
Vítor Pereira
Com 2 a 1 para os árabes, o treinador voltou para o segundo tempo com uma mudança tática: Erick Pulgar substituiu Arrascaeta. Não deu certo. Leo Pereira, machucado, deu lugar também a Fabricio Bruno.
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Vitor Pereira tratou a mexida como algo que lhe "custou muito". Não queria tirar um de seus grandes craques, mas tinha de escolher um entre os meias e, como Everton Ribeiro ajuda mais defensivamente, o uruguaio sobrou.
Arrasca não sobrava em intensidade, mas, mesmo ainda longe de seu melhor no aspecto físico, fazia das suas. O primeiro gol de Pedro nasce de uma jogada em que o camisa 14 tira quatro marcadores com rápida movimentação e toque para Everton Ribeiro.
Pulgar não entrou bem. Até começou encontrando soluções com toques de primeira para curtos espaços, mas logo passou a cometer erros simples, um deles seria definitivo.
Pois bem, antes do gol da pá de cal, Vitor Pereira acabou com a criatividade do meio-campo. Aos 23, trocou Everton Ribeiro por Cebolinha. Aos 24, Vietto praticamente sepultou as chances de reação em mais um grave erro individual, desta vez de Pulgar.
O Flamengo desanimou, foi colocado na roda e teve de ouvir os gritos de "olé" da torcida saudita. Não encontrou forças para reagir. Perdeu penetração, o meio-campo e o tesão. No fim, um gol de sorte marcado por Pedro deu uma ponta de esperança, mas não passou de um suspiro.
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Vítor não ousou um tudo ou nada em nenhum momento, e o time não conseguiu se contagiar mesmo com os insistentes pedidos de "Vamos virar, Mengô", gritados pela maioria dos 42.496 pagantes.
Um Flamengo que sonhava com o topo do mundo pela segunda vez agora se vê pressionado de novo, como no ano passado. O Mundial parecia factível e possivelmente tiraria a responsabilidade dos rubro-negros pelo menos em relação ao primeiro semestre.
A nova derrota traz repetidas lições e reforça dúvidas: o Flamengo terá pulso firme para manter Vítor Pereira em caso de novos insucessos ou possíveis fracassos podem ameaçar o português?
A resposta cabe à diretoria, e os títulos de peso agora só serão disputados no fim do ano. Incertezas e reflexões necessárias martelarão a cabeça do comando rubro-negro depois de uma terça-feira a esquecer para sempre.